É frequente e tem uma causa alérgica, diferente de todas as outras conjuntivites e, por isso mesmo não é contagiosa. Explicamos o que é uma alergia ocular, quais os sintomas, o que a provoca e como a tratar.
A doença alérgica ocular é muito frequente, estimando-se que atinja entre 15 a 20% da população mundial. Na realidade, cerca de 90% das doenças alérgicas observadas por um imunoalergologista têm um componente ocular associado, e cerca de 93% dos casos de rinite alérgica (febre dos fenos) têm sintomas oculares.
A alergia ocular é uma doença inflamatória da superfície ocular externa, frequentemente recorrente, evoluindo por crises, com sinais e sintomas bilaterais, embora muitas vezes assimétricos. O principal sintoma é o prurido ocular, podendo mesmo afirmar-se que “prurido ocular é sinónimo de alergia” e que “não há conjuntivite alérgica sem prurido”. Outros sintomas associados podem ser o lacrimejo, o ardor ocular, e a fotofobia.
Nem sempre a conjuntivite alérgica dá um quadro de olho vermelho evidente, pois muitas vezes a hiperémia é discreta. Pode existir edema palpebral e da conjuntiva (quemose), sobretudo nas formas agudas e secreções de tipo filamentoso. É, no entanto, característica a observação de papilas na conjuntiva palpebral, sobretudo na pálpebra superior, consistindo em pequenas elevações avermelhadas e que contêm células associadas à reação alérgica.
Existem várias formas clínicas de alergia ocular.
Conjuntivite alérgica sazonal
A conjuntivite alérgica sazonal (febre dos fenos) é a forma mais frequente de alergia ocular, correspondendo a cerca de 50% dos casos. Antes chamada de primaveril, pois as crises ocorrem mais na primavera, mas podendo ocorrer também no outono, ou em ambas as estações. Os alérgenos implicados são os pólenes (gramíneas, parietária, oliveira). O prurido ocular é o sintoma mais frequente, seguido do lacrimejo e ardor, sendo muitas vezes acompanhada por sintomas nasais de rinite (rinoconjuntivite alérgica).
Conjuntivite alérgica perene
Ocorre durante todo o ano, embora com períodos de agravamento. Os alérgenos implicados são os epitélios e pelos de animais (gato e cão), ácaros do pó da casa, fungos e também os pólenes.
Conjuntivite atópica ou vernal
É uma forma rara, mas grave, de conjuntivite alérgica em crianças e adolescentes, mais frequente no sexo masculino. É tipicamente sazonal (primavera até ao fim do verão) em crianças que têm uma história pessoal e familiar de atopia (predisposição para doenças alérgicas), frequentemente com eczema atópico, asma, rinite, alergias alimentares ou outras doenças alérgicas (em 75% dos casos). Muitas vezes não é possível identificar um alérgeno predominante, embora os pólenes possam exacerbar a doença. O primeiro sintoma é o intenso prurido, seguido de fotofobia, ardor, sensação de corpo estranho e visão turva. Na conjuntiva palpebral superior observam-se as típicas papilas gigantes (em pedra de calçada), muitas vezes com nódulos gelatinosos de Trantas à volta da córnea. O prurido intenso, que motiva um coçar violento dos olhos por parte da criança, pode causar complicações como úlceras de córnea e deformações corneanas (queratocone). Geralmente estas formas melhoram após a puberdade.
Queratoconjuntivite superior límbica
Surge no contexto de alergia / intolerância a lentes de contacto ou aos seus produtos de limpeza e conservantes. Há uma reação papilar na pálpebra superior, com papilas gigantes (com ou sem queratopatia) e o doente refere desconforto quando coloca as lentes de contacto. Pensa-se que a aderência de alérgenos ambientais, na superfície da lente de contacto, origine uma sensibilização da conjuntiva durante o pestanejo.
Blefaroconjuntivite de contacto
É uma forma de alergia ocular por hipersensibilidade de contacto a fármacos, conservantes ou cosméticos. Vários fármacos podem induzir esta forma de alergia: anestésicos, atropina, gentamicina, neomicina, tobramicina, antivíricos, pilocarpina, timolol. Os conservantes utilizados nos colírios (cloreto de benzalcónio, clorobutanol, clorhexidina e outros) podem igualmente induzir esta forma de alergia ocular. As pálpebras são particularmente predispostas a dermatite de contacto alérgica ou irritativa. A transferência acidental “mão-pálpebras” de produtos químicos (conservantes, cosméticos, produtos de cabeleireiro, vernizes das unhas, shampoos, sprays, tintas, níquel) é frequente. A diferença entre uma verdadeira reação alérgica ou tóxica pode ser difícil, porque alguns fármacos e químicos podem induzir ambas as reções, por mecanismos dependentes da concentração.
Tratamento
Embora a grande maioria das conjuntivites alérgicas não seja grave (exceto a atópica em crianças), são, no entanto, muito incomodativas O tratamento da alergia ocular tem duas vertentes, uma não farmacológica e outra farmacológica. Na primeira, a evicção do alérgeno seria o tratamento ideal, mas nem sempre possível. É fácil evitar os epitélios e pelos de animais e o uso de ar condicionado. Mais difícil é evitar as atividades no exterior, durante os períodos de polinização, ou evitar os ácaros do pó da casa.
No entanto, algumas medidas simples podem melhorar os sintomas. A aplicação de compressas frias por cima das pálpebras pode melhorar o prurido, já que a libertação de histamina depende da temperatura. Ao baixarmos a temperatura na conjuntiva, diminuímos a libertação de histamina e consequentemente o prurido. A aplicação de lágrimas artificiais é outra medida simples, ao arrastar para a superfície os alérgenos pre- sentes na conjuntiva, diminuindo a reação alérgica.
Hoje temos fármacos extremamente eficazes e seguros para o tratamento da alergia ocular. Os mais indicados são os chamados agentes de ação múltipla (anti-histamínicos e estabilizadores da membrana dos mastócitos – preventivos de crises) como a olopatadina e o quetotifeno. Têm um início rápido, longa duração (12 horas) e proporcionam um controlo sintomático prolongado. São bem tolerados e seguros, podendo ser utilizados em crianças. Estão indicados em todas as formas clínicas de alergia ocular e podem ser utilizados durante períodos de tempo prolongados.
Rui Proença (Médico Oftalmologista)
Saiba mais em: https://ccci.pt/a-alergia-ocular-explicada/